terça-feira, julho 03, 2012

Geduld VI








É assim. quando ele chega cheio de malas etiquetadas: a confiança, a segurança, a amizade e a cumplicidade, o apoio e o ombro esquerdo, o ouvido e a voz empática: deixa-o entrar pelas portas da frente. abertas de par em par. oferece-lhe um lugar para se sentar e um chá para se aconchegar. deixa-o ficar.

E quando chegou e se acomodou, espalhou as suas tralhas nesse espaço que é teu, mas que cedeste não por falta de alternativa mas por essa convicção quase patética a que de se dá o nome de amor, pergunta-lhe....


e o romance? 


quinta-feira, setembro 29, 2011

PASSAGEM DOS SONHOS



Inclinada ou deitada sobre o braço esquerdo
é uma mulher-montanha ou uma montanha-mulher
da cintura para cima vê-se o corpo nu
no seio do lado direito há uma ferida-cratera violácea
ela diz: aqui é luz
depois movendo a mão direita
assinala outro sítio que não é bem o seio esquerdo
julgo que ainda é o seio direito
e diz: aqui é sombra
(não é bem sombra o que ela diz
seria antes o lugar de uma cor
que não sei porquê se opõe à luz)
depois desce lentamente com um dedo espalmado
na direcção do sexo
a unha ao deslizar abre um sulco-ranhura
semelhante a uma fenda aberta na terra
já não se vê carne mas uma planície
com no meio a fenda separadora
descendo mais a mão desaparece entre sedas
que revelam-ocultam outro corpo montanha

Mário Cesariny, in "19 Projectos de Prémio Aldonso Ortigão Seguidos de Poemas de Londres" quadrante, 1971


* Descaradamente copiado do Blog O café dos loucos
http://ocafedosloucos.blogspot.com/

quarta-feira, setembro 21, 2011

Heim . V



O corpo já não pede, o corpo já nã fala. Vai ficando assim, como que desfalecido em posição de vida para que ninguém se dê conta. Para que ninguém se dê conta de uma inércia contagiosa que vai contaminando aos poucos cada célula orgânica e quiçá também inorgânica. É teimoso esse corpo estranho... vai ignorando, relativizando os sintomas e os sinais. O corpo vai-se agarrando, por força de uma circunstância desconhecida mas por certo existente, às coisas e aos lugares, aos compromissos e ás pessoas... inventa o amor, a amizade, semeia responsabilidades e contratos se não físicos pelo menos então mentais. Tudo para ficar na posição correcta das coordenadas da vida que foi assumindo como sua.

O corpo já não deseja. O corpo espera. Vai esperando assim.

quarta-feira, julho 06, 2011

Geduld V




A paciência guarda sempre um punhado de areia na mão esquerda.

Esfrega os olhos menina e deixa passar o tempo...



... só enquanto o amor não vem.

terça-feira, junho 07, 2011

my own private fukushima...




Preocupam-me essas vezes em que sob a superfície intacta de um sorriso sinto os focos de

explosão na central do meu coração.

sexta-feira, maio 27, 2011

N.N.




Que nome se dá a esse medo que nos persegue de quando em vez nos momentos de entrega?

E como explicar essa necessidade vital de não lhe perder o rastro?

Será amor: este medo de perder o medo?

segunda-feira, abril 11, 2011

1 . beatriz .


new york.
Originally uploaded by Sandra Beijer



agarra-me a mão no escuro.

lado a lado. olhamos o palco. agora de frente. aquele palco foi nosso um dia e as recordações teimam em fazer-me querer lá voltar...

para onde foram as metáforas? e os eufemismos? onde se escondeu a ficção?

agarra-me a mão no escuro. agora quando a cortina se fecha... tu e eu, ficamos do lado de fora.